O lado Roma da civilização.

A Fontana di Trevi vista de frente. Aparece um pouco da água, verde. Mas o destaque é para as esculturas da fonte.

Netuno esplendoroso com seus “cavalos” (metade cavalos e metade criaturas marinhas). Ao fundo, Abundância e Saúde.

Céu azul sem uma nuvem sequer. Gente nas ruas. Pessoas felizes. Pessoas cantando na parte externa de um bar. Ruelas acolhedoras e cheias de histórias para contar. Aromas que falam direto ao estômago. Sorrisos! Calor mais agressivo do que o desejável. Sorvetes que estão ali para dar uma ajudinha nisso. Mmmmm…! Sorvetes! Os melhores da minha vida.

Os dias que passei em Roma, em julho de 2009, foram alguns dos mais agradáveis e memoráveis da minha existência. Roma não é uma cidade qualquer. Transpira alegria, cultura e irreverência. Da convivência amigável entre construções de diversas épocas à variedade de sabores da sua gastronomia, aquela é uma cidade rica e caminhar por suas ruas é algo realmente fora do comum. Eu disse caminhar? Bom, na verdade, caminhar pelas ruas pode não ser fora do comum, no sentido literal da expressão. Já atravessá-las, meus amigos, pode ser epopeico.

Uma rua em primeiro plano, com automóveis. E em segundo plano, uma construção bem antiga. Acho que é o Foro Romano.

Mágica mistura de épocas.

Engana-se quem pensa que um semáforo em vermelho faz os motoristas pararem no sinal. Ali? Não. É preciso ser mais dramático. Uma luzinha vermelha? Ah, isso não é nada! Mostre aos romanos do que você é capaz para chegar à calçada que está do outro lado. Vamos, você pode!

Eu confesso que houve momentos em que eu já tinha preguiça de tentar atravessar uma rua lá. As mais estreitas eram fichinha. Mas e as mais largas e movimentadas? Parece simples. “Oras, é só ir atravessando e pronto”, muitos me diriam. Não, meus caros. Dá medo. Mas a união faz a força e, como Roma é uma cidade que está sempre cheia, sempre aparecem mais pessoas para engrossar esse caldo. De modo que o segredo do sucesso era aguardar até que se juntasse um grupo de indivíduos desejosos por atravessar a rua em questão. E voilà! Ou melhor: andiamo!

Houve, porém, um dia em que estávamos apenas eu e um senhorzinho que levava uma bengala. Mesma situação citada anteriormente: sinal vermelho e automóveis passando como se não fosse com eles. E duas criaturas querendo atravessar a rua e não conseguindo. Mais eis que o destemido velhinho surpreende! Alça a bengala ao alto e, com os joelhos levemente flexionados, vai caminhando pela faixa de pedestres, com a perna direita adiante e a esquerda atrás, enquanto desbrava, com a bengala, o caminho em direção à calçada do outro lado.

Enquanto tal cena acontecia e os carros iam parando, outras pessoas chegavam para atravessar a rua e se beneficiavam da ação bem sucedida daquele valoroso espadachim! Ou “bengalachim”, para ser mais exata.

Um famoso cruzamento, o Quattro Fontane, onde há uma fonte em cada esquina.

Cruzamento que é ponto turístico: Quattro Fontane, onde cada esquina tem uma fonte.

No livro “Comer Rezar Amar”, a autora diz que a palavra que define Roma é sexo. Discordo. A palavra mais adequada àquela cidade, para mim, é drama. No sentido teatral, claro.

Tive algumas experiências que me fizeram chegar a essa conclusão. Quem não se lembra do funcionário da estação de trem, gritando, com cara de desespero e os braços erguidos aos céus: “Eu não seeeei! Eu não seeeeeeeeei!”? Foi o máximo, não é mesmo? Coisas que só acontecem lá.

Pois eu tive outras amostras da dramaticidade dos romanos e acabei achando que é uma forma de expressão bem interessante. Não quero, com isso, dizer que todos são assim. Óbvio que não. Mas terminou por ser a característica que mais me marcou. Talvez por eu tê-la achado a mais especial, entre outras que certamente o povo romano tem.

Quem já esteve lá ou mesmo já viu algum documentário ou leu a respeito, sabe que a Fontana di Trevi é um dos pontos turísticos mais importantes e visitados da cidade. E também sabe que manda a tradição que o turista jogue, de costas e de olhos fechados, uma moeda na fonte, com o objetivo de voltar a Roma. Como joguei uma moeda de 5 centavos, não voltei até hoje.

A Fontana di Trevi é um lugar que me pareceu bastante agradável. Fiquei surpresa ao vê-la pela primeira vez, pois esperava que a sua construção fosse do tipo “ilha”. Não sei se me expresso bem, mas pensei que fosse a típica fonte que pode ser rodeada. Mas não. Sua composição é mais no estilo “teatral”, por assim dizer. Vale lembrar que não entendo nada de fontes e nomes técnicos para designar suas características formais.

Detalhe de uma vista lateral da Fontana di Trevi. Vê-se uma das saídas de água, o espelho d'água e a arquibancada que mencio no texto, com muitas pessoas sentadas.

A Fontana di Trevi observando o povo na arquibancada!

Pois bem. O que quero dizer com “teatral” é que a fonte está construída para ser vista de frente. E, aliás, possui uma extensa arquibancada em forma de meio-círculo diante da cena retratada. Não raro os visitantes chegam e sentam, enquanto admiram as estátuas que simbolizam a Abundância, a Saúde e Netuno, guiando dois tritões que levam “cavalos”. Entre aspas porque são metade cavalos e metade criaturas marinhas. E tritões são criaturas mitológicas metade homens e metade seres marinhos também.

E lá estava eu, saboreando um delicioso sorvete de melão (altamente recomendável) e contemplando aquela cômica cena. “Cômica cena, Adriana?? Abundância, Saúde e Netuno com dois cavalos é cômico para você?” Calma, vocês não esperam eu molhar o bico.

Pouca gente sabia, mas havia um personagem vivo, por assim dizer. Enquanto dezenas de turistas se divertiam jogando moedas na fonte, uma pessoa atentamente as observava. Estava escondida. E não era eu.

Quanta inocência pensar que se podia tocar a água da Fontana di Trevi! A jovem senhora visitante mal encostou seus dedinhos no espelho d’água e apareceu, sabe-se lá de onde, um cara de uniforme que praticamente pulou em cima dela e, com trejeitos dignos de um personagem da Praça é Nossa e um apito para lá de estridente, gritou: “Preeego!”

A reação da moça foi rir. Acho que eu faria o mesmo, ainda que involuntariamente. É que as expressões do guarda eram tão caricatas que ficava mesmo difícil manter a compostura. Diante do riso da turista, o oficial apitou mais uma vez e, ela, então, compreendeu que aquilo não se tratava de uma palhaçada, mas que era, sim, bastante sério. Não é permitido meter a mão na água. Ela pediu desculpas e se retirou.

O mais engraçado é que a cena se repetiu algumas vezes enquanto eu estive lá. Com outros turistas, óbvio. Fiquei me perguntando por que o guarda não ficava mais exposto, tomando conta do local. Eu poderia dar o palpite de que ele na verdade se divertia ao se esconder e aparecer de surpresa dando flagrante. Mas o semblante fechado dele me dizia que não.

Como passei tempo suficiente ali sentada, observando, acho que só eu que me divertia, assistindo a essas curiosas “esquetes” improvisadas. Puxa, obrigada, guarda da Fontana di Trevi! Ri muito graças a você.

Roma é assim, afinal. Mais do que uma cidade. É uma coletânea de histórias divertidas.

Fundo da fonte com algumas moedas.

Ô, pessoal! Só moeda de 5 centavos. Netuno está vendo, hein!

Vejam também:

o lado TEATRAL de ROMA

Um comentário em “o lado ROMA da CIVILIZAÇÃO

  1. Cidália Rivas

    Adriana, foi muito gostoso recordar essa tua aventura em Roma.
    A tua narrativa, como sempre, me faz acreditar que estou no local da cena.
    É muito bom viajar através do teu blog! Bjs!

    Responder

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