O lado epopeico do salmorejo.

Salmorejo com jamón serrano e ovo cozido em cubinhos.

Salmorejo que preparei combinando com a minha mesinha dobrável. Ou o contrário.

Uma das invenções de que mais gosto na culinária espanhola é o salmorejo. O seu parente mais próximo, o gazpacho, talvez seja mais conhecido no Brasil. Pelo menos de nome.

A minha família por parte de pai é espanhola, mas eu nunca tinha experimentado gazpacho ou salmorejo quando estive com eles, na região conhecida como Galícia, ao noroeste da Espanha. Nem meu pai nunca preparou essas iguarias. Ao contrário, preparou e, muitas vezes, tantas outras delícias, típicas da sua região.

O gazpacho e o salmorejo, no entanto, são típicos do sul do país, a região chamada de Andaluzia. Ou Andalucía, em Espanhol. E, claro, devido à sua leveza e refrescância, é popular em muitas outras regiões. Como Madri, por exemplo.

A primeira vez que tomei conhecimento da existência do gazpacho foi, por volta dos 15 anos de idade, no curso de Espanhol, em Niterói. Naquele dia, a professora havia colocado um filme de Almodóvar para a turma assistir. Mulheres à beira de um ataque de nervos.

Em um dado momento da história, uma das personagens bebe desesperadamente um líquido vermelho, entornando uma garrafa praticamente para dentro da goela. A professora, então, falou: “Ela bebeu gazpacho. Uma sopa fria, feita de tomate, que é muito popular na Espanha.”

Aquilo me chamou atenção. Sopa. Fria. Tomate. Saudável? Provavelmente sim. Gostosa? Deve ser. A mulher do filme devorou!

Aí, pronto. Eu queria porque queria tomar gazpacho. Gente, como sou influenciável!

Mas, naquela época, não havia internet. Pelo menos, não na minha casa. E eu não tinha como achar um receita da sopa. A menos que eu vasculhasse livros de receita. E, mesmo assim, sem a certeza de que iria encontrar, pois se tratava de algo muito específico. Ou seja, deixei para lá.

Muitos anos depois, uma revistinha semanal de jornal veio com uma receitinha de gazpacho, sabe-se lá por quê. E eu fui, toda animada, comprar os ingredientes e prepará-lo. A sopa é, na verdade, um suco. Eu a classificaria assim. Afinal, nenhum dos seus componentes passa por qualquer tipo de cocção. Tudo cru e batido no liquidificador. Tomate, pepino, pimentão… Sei lá mais o quê. Uma mistura de tantas coisas saudáveis e resultando em algo gostoso seria maravilhoso. Mas ficou horrível. Porém eu tomei metade mesmo assim. O resto não consegui.

Ou eu não gostava de gazpacho e pronto ou eu não tinha conseguido prepará-lo direito. Das duas, uma. Mas esqueci isso e deixei para lá de novo.

Anos depois, quando fui morar em Barcelona, vi a sopinha sendo vendida no supermercado. “Vou comprar!”, pensei, animada. Afinal, já estava pronto. Não tinha como dar errado. Mas, mais uma vez, estava intragável. Foi aí que comecei a considerar o fato de que meu paladar não estivesse educado nesse sentido. De fato, tomar algo salgado e frio não fazia parte do meu repertório de sabores e sensações alimentares.

Também descobri que a receita varia muito de revista para revista, de livro para livro, de supermercado para supermercado e de cidade para cidade. Não desisti e, quando fui à Andaluzia, a primeira coisa que fiz foi pedir um gazpacho para almoçar. Na verdade, era a única coisa que havia no único restaurante que encontrei aberto às quatro horas da tarde, quando cheguei a Granada. Sim, era hora da siesta e tudo estava fechado.

Não sei se foi porque eu estava com fome ou se foi porque eu estava na região certa para tomar esse prato ou se foi porque era a única coisa que tinha para comer. Só sei que esse foi o primeiro gazpacho de que gostei. Também, né? Quais foram os outros? O meu e o do supermercado. Estou forçando a barra.

Depois de ter tomado um gazpacho de verdade, eu consegui fazer um gazpacho decente. Claro, porque, então, eu tinha parâmetros.

Delicioso gazpacho feito por mim :P

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Mas o melhor ainda estava por vir! Foi aqui, em Madri, que eu provei o parente mais próximo do gazpacho: o salmorejo. Mais cremoso, mais fácil de preparar e — eu achei — mais saboroso.

Nada mais é do que um mistura de tomates, miolo de pão amanhecido e azeite. Só. E, para preparar, é muito fácil.

RECEITA DE SALMOREJO

  • 500 g de tomates bem maduros
  • 100 g de miolo de pão amanhecido (como sempre estou com pressa, uso pão de forma novo mesmo, sem a casca)
  • 100 mL de azeite de oliva extravirgem
  • sal a gosto
  • 1 dente de alho se quiser (eu não coloquei)

Faça uma cruz nas bases dos tomates e dê uma aferventada neles. 1 min e meio em água fervente é suficiente. Retire-os da água quente e coloque-os em uma tigela com água gelada. Isso fará com que eles soltem a casca e facilita para descascar. Em um recipiente, disponha o miolo de pão e, em cima, os tomates cortados em pedaços pequenos. Coloque meia colher de sopa de sal para que os tomates soltem mais líquido e possam deixar o pão mais úmido. Espere um pouco. Se o pão for novo, não precisa fazer essa parte. Coloque o pão e os tomates num liquidificador e bata até ficar bem fino. Logo, adicione o azeite e o alho e bata tb. Prove se está bom de sal. O salmorejo se toma frio e pode ser acompanhado com ovo cozido em cubinhos e jamón serrrano também em cubinhos. Bom apetite! Ou: ¡Qué aproveche!

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